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O exemplo norteamericano
Neutralizar a aristocracia

Herbert Aptheker (excertos)

Thomas Jefferson, na sua Autobiografia, afirmava que, na Virgínia, havia quatro leis aprovadas durante o período revolucionário, que formavam "um sistema pelo qual seriam erradicados todos os vestígios da antiga ou futura aristocracia; e uma fundamentação destinada a um governo verdadeiramente republicano". Duas delas — a separação da Igreja do Estado e os esforços no sentido de estabelecer a instrução pública — já foram suficientemente descritas. Para as outras duas nos valeremos das próprias palavras de Jefferson:

A revogação das leis sobre o fideicomisso evitaria a acumulação e a perpetuação de riqueza em famílias seletas, e preservaria o solo da pátria de ser diariamente mais e mais absorvido pelos bens inalienáveis. A abolição da primogenitura e a partilha igual das heranças removeriam as distinções feudais e antinaturais que faziam rico um membro de cada família, e pobres todos os demais, sendo substituídas pela partilha igual, que é a melhor das leis agrárias.

Entail (Fideicomisso) - estabelecimento de um legado, em terras, a uma linha particular de indivíduos (sucessores), de tal modo que nenhum deles possa aliená-lo — o que tendia a congelar a propriedade da terra.

Mortmain (bens de mão morta) - é a posse de terra por aqueles que não podem aliená-la — quer por venda ou outro instrumento; i.e., uma posse inalienável, ou o resultado necessário da lei do fideicomisso.

Primogenitura - o direito, em lei, pelo qual o filho mais velho herdava todos os bens do pai.

Todos esses dispositivos eram o alicerce sobre o qual repousava a lei feudal, garantindo a estabilidade e a concentração da propriedade de terra, tão vital ao feudalismo.

A importância dessas leis e instituições feudais no que diz respeito à Virgínia, e a motivação revolucionária para a sua revogação, são descritas novamente na palavra autorizada de Jefferson, na sua Autobiografia:

Nos primeiros tempos da colônia, quando as terras eram obtidas por pouco ou nada, alguns indivíduos previdentes trataram de conseguir grandes áreas e, desejosos de fundarem grandes famílias, garantiram a transmissão delas aos seus sucessores por meio do usufruto (i.e., não estavam sujeitas à alienação). A transmissão dessa propriedade de geração a geração, no mesmo nome, deu ensejo ao aparecimento de determinado tipo de família que, sendo privilegiado por lei, na perpetuação de sua riqueza, era assim, transformado na classe dos patrícios, distinguida pelo esplendor e luxo de suas propriedades. Dessa classe, o rei também habitualmente seleciona seus conselheiros de Estado; estes, em troca da distinção, devotam-se inteiramente aos interesses e à vontade da Coroa.

Jefferson continua:

Para anular esse privilégio, e ao invés de uma aristocracia da riqueza, que traz maiores males e perigos que benefícios para a sociedade, para abrir uma passagem à aristocracia da virtude e do talento, que a natureza tão sabiamente criou para a direção dos interesses da sociedade e espalhou, de igual modo, por todas as classes, foi criada essencialmente a república bem organizada.

(...)

Além da eliminação da primogenitura e do fideicomisso na Virgínia e Carolina do Norte, os legislativos de outras regiões aprovaram importantes leis de natureza similar, às vezes com detalhes desnecessários. Assim, a primogenitura terminou na Geórgia em 1777; em Maryland em 1785; e na Carolina do Sul em 1790. A legislatura de 1780 de New Jersey acabou com a primogenitura, estabelecendo, contudo, que o quinhão de herança dos adultos do sexo masculino seria o dobro do das mulheres. A inalienabilidade de terras foi proibida em New Jersey em 1784 e em New York dois anos depois. Além disso, em New York, o regime senhorial e os privilégios dos latifundiários, que eram mantidos pelos morgados do rio Hudson desde os tempos dos holandeses, foram liquidados pela legislação revolucionária. Aqui, contudo, a impossibilidade de eliminar todos os privilégios especiais — em termos de arrendamento das terras em mãos dessas famílias — deu origem à agitação social, alcançando mesmo proporções insurrecionais, já quase no século XIX.

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